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quarta-feira, 22 de junho de 2016

Inacessibilidade em Shopping

Momentos ruins também são inesquecíveis, também nos ensinam e também precisam ser compartilhados para que não se repitam. Momentos ruins nem sempre são bons para serem comentados, pois expõem os envolvidos e nos fazem reviver situações tristes.

Porém, um ano depois do acontecido, decidi expor um desses momentos inéditos e raros em minha vida, que poucos souberam. Não para falar mal do estabelecimento, mas para suscitar em todos nós a reflexão. O que podemos fazer para mudar? Como cada um pode contribuir para facilitar o direito de ir e vir de todas as pessoas independente de deficiência? Será que valeria a pena investir em piso tátil? Investir em treinamento dos funcionários?

Decidi contar isso também porque ouvi, há duas semanas, que uma cega do RJ queria bater perna no shopping e o segurança não quis acompanhá-la. Então pensei: e se eu quiser fazer o mesmo, tenho que depender de quem enxerga? E se a pessoa não quiser ir eu tenho que deixar de ir?

O fato aconteceu no ano passado, em um shopping de Maceió. Era dia dos namorados. Meu plano: chegar mais cedo, passar em duas lojas e depois encontrar meu esposo na praça de alimentação. Eu tinha a intenção de comprar uns mimos para fazer uma surpresa para ele. Mas acredite: quem ficou surpresa fui eu, ao constatar o despreparo dos funcionários na hora que viram uma cega lá sozinha precisando ir em três locais. De nada adiantou eu falar que já havia feito isso antes, em outros shoppings da cidade. A saga foi assim:
1. O taxista que me deixou no shopping pediu para que algum segurança me levasse na loja 1 e ele não deu a mínima importância. Olha que a loja 1 era no mesmo piso! Indignado, o taxista me deixou lá.
2. Ao fazer a primeira compra, pedi a funcionária da loja para me conduzir à saída e chamar um segurança. Procedimento que sempre fiz e deu certo em outros shoppings. Porém, o segurança do local me explicou que não poderia me levar na loja 2, eu teria que ir ao SAC solicitar o auxílio de atendimento especial. A mesma funcionária me levou até lá.
3. No SAC, expliquei que precisava ir em uma loja e na praça de alimentação, bastava designar um funcionário para me auxiliar. Que eu já havia feito isso antes em outros shoppings e nunca tive problema! Nem sequer precisei ir a ao SAC. Ligaram pra um e pra outro, mas ninguém estava disponível. Fui informada que havia apenas um segurança por piso e que ele não podia sair do local para me levar a pisos superiores nem à escada rolante. Eu me perguntei: será que realmente estamos seguros nesse shopping?
Insisti: E agora, como vamos resolver? Eu vim sozinha e preciso fazer compras. Se o shopping não tem piso tátil, tem a obrigação de fornecer o mínimo de acessibilidade indicando alguém para me auxiliar, concorda? Como vocês fazem quando um cego vem sozinho pra cá?
A única resposta que tive foi para aguardar mais um pouco. Depois de esperar vários minutos, decidi ir embora. Mas então, a moça que havia me levado ao SAC, (eu nem sabia que continuava lá), se ofereceu para me conduzir à loja 2 e à praça de alimentação. A atendente do SAC ainda tentou se desculpar dizendo que não havia funcionários capacitados para atender a minha solicitação. Estava claro que ela não sabia que pra esse tipo de coisa não é preciso capacitação alguma, apenas de um “olho amigo”.

Cinco minutos depois, comprei os produtos que queria e fui encontrar meu esposo. Fiquei indignada, nem tinha mais clima para comemoração!
Após o almoço, Como ir embora?
Decidimos procurar a saída da praça com os nossos próprios ouvidos e bengalas. Nessa hora, Alguns clientes se ofereceram para nos ajudar.

Hoje, mais de um ano após esse lamentável acontecimento, eu me pergunto: quanto cegos foram ao shopping desde aquele dia? Será que já tem mais de um segurança em cada piso? Será que outros cegos que passaram por situações semelhantes também se manifestaram para que a gerência soubesse que é importante fornecer treinamentos e pensassem na acessibilidade?

Se algo mudou no estabelecimento, só indo pra saber! Desde aquele dia, nunca mais fui lá sozinha. Dou preferência à concorrência, que tem feito um trabalho digno de aplausos. Mas tenho consciência que será preciso voltar e ver o que acontece.
Nós, pessoas cegas independentes, temos obrigação de esclarecer e lutar para que outros cegos não passem pelos mesmos problemas que nós. Tenho consciência que precisamos vestir a camisa de locais inacessíveis para ensiná-los o que é acessibilidade, mostrar que existe um público consumidor com deficiência e que é preciso enxergá-lo.
Mesmo que mais nenhum cego tenha se aventurado sozinho pelo shopping, isso pode acontecer hoje, amanhã ou depois. E é preciso que as pessoas estejam preparadas para auxiliar todos os consumidores da melhor maneira possível.

3 comentários:

  1. Trabalho em um shopping no RJ e no ter erro piso deste. O banheiro pra "deficientes" fica no terceiro piso e havia um casal de cegos na porta aguardando a chave para ir ao banheiro. Além de ter o banheiro no terceiro piso ainda trancam?!
    E no bairro onde tem escola referência para cegos e no bairro vizinho escola Referência para surdos.
    O que a maioria pensa?!
    Que só consome e gasta quem se denomina "normal"?!
    Realmente deveria ter uma campanha de conscientização para um pouco mais de acesso universal!
    Patrícia Moreno.

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    Respostas
    1. Oi Patrícia!
      Sem falar que dependendo da deficiência, não é preciso utilizar o banheiro feito pra deficiente.
      Eu sempre usei banheiro comum, aqueles pequenininhos, e quando me colocaram em um enorme eu fiquei completamente perdida por alguns segundos.
      Acho que esse tipo de banheiro é mais pra cadeirante.
      Mas sim, qualquer banheiro em shopping deve ficar destrancado...
      Essas coisas vão começar a mudar quando mais deficientes começarem a ir. Eles se acostumarão..,

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  2. Trabalho em um shopping no RJ e no ter erro piso deste. O banheiro pra "deficientes" fica no terceiro piso e havia um casal de cegos na porta aguardando a chave para ir ao banheiro. Além de ter o banheiro no terceiro piso ainda trancam?!
    E no bairro onde tem escola referência para cegos e no bairro vizinho escola Referência para surdos.
    O que a maioria pensa?!
    Que só consome e gasta quem se denomina "normal"?!
    Realmente deveria ter uma campanha de conscientização para um pouco mais de acesso universal!
    Patrícia Moreno.

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